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Data da publicação: 06/09/2013

Dar aulas no ensino médio e fundamental é apenas uma entre as inúmeras opções que se abrem diante daqueles que amam aquela que é odiada por tantos

Matemática é uma maneira de resolver problemas que desafiam pesquisadores
nas mais diferentes áreas do conhecimento (crédito: Nilton Junior/ArtyPhotos)

Ela atormenta a vida de muitos e encanta poucos. Menor ainda é o número daqueles que, entre esses poucos, têm a coragem de assumir a paixão por ela e se tornarem matemáticos. O resultado dessa equação é simples: a escassez leva esses profissionais a serem disputados no mercado de trabalho.

Certamente, o cenário tradicional de uma escola de ensino médio e fundamental com falta de professores de matemática e baixos salários surgiu em sua mente. Certo e errado. Certo porque, de fato, esse é o cenário que será ocupado, na maioria das vezes, por quem escolhe cursar Licenciatura em Matemática. Errado porque o universo dos matemáticos vai muito além disso e, mesmo quem opta por lecionar no ensino médio e fundamental, pode alcançar uma remuneração digna. 

“Todos têm opiniões prontas sobre mercado e salário de professores. Obviamente, não direi que o salário não é um problema e que o professor não precisa ser melhor valorizado no Brasil, mas existem sim boas condições de trabalho e formas de atingir os objetivos sendo um profissional bem formado, bem capacitado e comprometido com seu trabalho”, afirma o professor Marcelo Pereira.

Em 2005, ele ingressou pela primeira vez no curso de Licenciatura em Ciências Exatas da USP São Carlos e completou a habilitação em Física em 2008. O curso é oferecido pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) em parceria com os institutos de Física e de Química e possibilita obter habilitação em Física, Química e Matemática. Mas Pereira não parou aí: em 2009 ingressou no mestrado em Ensino de Física e, paralelamente, cursou a habilitação em Química. Não satisfeito, em 2012, ele iniciou a habilitação em Matemática e vai se formar no final deste ano.

Ainda quando estava no mestrado, Pereira começou a lecionar em escolas públicas da cidade e, hoje, é professor de matemática em duas escolas particulares: o Colégio Vincere e o Colégio São Carlos, onde ministra também aulas de física. Ele aconselha quem pensa em seguir esse caminho: “é preciso querer transformar, ter gosto por transmitir conhecimento e procurar pela melhor maneira de fazê-lo”.

Outra professora que sonhava em dar aulas de matemática para o ensino médio quando começou a graduação é a atual chefe do Departamento de Matemática do ICMC, Márcia Federson. “Eu queria ser professora no colégio onde eu estudava e, quando estava no segundo ano da faculdade, o diretor da escola me chamou para dar aula e desmoronou o meu sonho futuro. Então, eu precisei rever meus planos e vislumbrei o caminho do mestrado e do doutorado”, contou.

Tal como Federson, a maioria dos alunos que ingressam na matemática nem imaginam que há a possibilidade de se tornarem pesquisadores e seguirem carreira acadêmica no ensino superior. Segundo a professora, esse é um caminho totalmente desconhecido pelos alunos do ensino médio. Tanto que, no próximo ano, a professora está planejando realizar uma divulgação por meio de visitas às escolas de ensino médio de São Carlos e região: “Vamos perguntar aos estudantes: vocês gostam de matemática? Já pensaram em ser como eu?”

Tem um doutor em matemática aí?

Doutores em matemática fazem falta no ensino 
superior brasileiro (crédito: Nilton Junior/ArtyPhotos)
Segundo pesquisa da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), em 2012, havia em todo o Brasil cerca de 2 mil doutores em matemática. Para se ter uma ideia do quanto esse número está aquém do necessário, a Austrália, um país que tem apenas 22 milhões de habitantes, tem aproximadamente esse mesmo número de doutores na área.

“Considerando-se o mercado de trabalho para doutor no país, por enquanto, há emprego para todo mundo. Não conseguimos formar nem o suficiente para repor aqueles que se aposentam nas universidades públicas estaduais e federais”, contou Federson. “No ICMC, por exemplo, não existe nenhum egresso de doutorado desempregado, estão todos trabalhando em universidades qualificadas”, completou. 

A carreira no ensino superior pode ser muito atraente, levando-se em conta que a remuneração aqui é bem melhor se comparada à dos professores do ensino médio e básico. “Como professor aposentado da USP, meu salário não é ruim. Se eu fosse um homem ambicioso, quisesse barco, casa na praia, não daria. Mas como filho de uma empregada doméstica que morava em um barraco que nem luz tinha, cheguei longe demais. Pude viver decentemente, meus filhos fizeram universidade. Então, meu salário não é ruim. Mas quem alfabetiza meu neto, ganha mal demais. Esse país vai ser sério não quando aumentarem meu salário, mas quando os alfabetizadores ganharem o que eu ganho como professor titular da USP”, alfineta o matemático Luiz Barco. 

Na busca por atrair os jovens para a carreira acadêmica no ensino superior, Federson mostra a possibilidade de fazer mestrado, doutorado e pós-doutorado com bolsas de estudo. Atualmente, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) oferece bolsas para mestrado (R$ 1,6 mil por mês no primeiro ano do curso e 1,7 mil depois), para doutorado (R$ 2,4 mil por mês no primeiro ano e 2,9 depois) e para pós-doutorado (R$ 5,9 mil). O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e o Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) também oferecem bolsas (acesse os links e verifique o valor de cada bolsa oferecida).

Em uma pesquisa realizada pelo CareerCast.com, site norte-americano especializado em empregos, as carreiras de professor universitário e de matemático estão entre as melhores profissões dos Estados Unidos: a primeira ficou em 14º lugar e a segunda em 18º em uma lista que avalia um total de 200 carreiras. Divulgado anualmente, o ranking leva em conta demandas físicas, ambiente de trabalho, renda, estresse e perspectivas de contratação.

Federson: o caminho do mestrado e do doutorado só nasceu quando
ela já estava no segundo ano da graduação (crédito: Denise Casatti)


O universo além do ensino

É comum pensarmos que, para estudar matemática, é preciso ser “especial”. Nós nos esquecemos de que, na verdade, a matemática é uma maneira de resolver problemas que desafiam pesquisadores nas mais diferentes áreas do conhecimento.

Por isso, cada vez mais, os formados nos cursos de Bacharelado em Matemática e de Bacharelado em Matemática Aplicada e Computação Científica têm sido requisitados para atuar no mercado. Na área financeira, eles contribuem, por exemplo, na avaliação de risco, na realização de pesquisas de mercado e modelagem; na indústria, efetuam simulações e otimizam processos; nas empresas de softwares, trabalham com geometria computacional, gráficos e elementos finitos e também desenvolvem pesquisas em centros de pesquisa e desenvolvimento públicos e privados.

“O Bacharel em Matemática Aplicada e Computação Científica é esse profissional que irá trabalhar na indústria, no comércio e na área de finanças. Não é que esse profissional trabalhe com a matemática concreta, isso nem é possível, mas ele vai ajudar a tratar problemas concretos através dos números, utilizando o computador como ferramenta de trabalho”, ressaltou o professor do ICMC, Oziride Manzoli Neto. 

O analista sênior de precificação e risco no Banco Bradesco, Gabriel Dias Pais, formou-se como bacharel em Matemática Aplicada e Computacional no ICMC em 2009. Desde então, ele trabalha com aplicações matemáticas e estatísticas na área de finanças, um campo também conhecido como Engenharia Financeira. “Existem diversas instituições financeiras que contratam recém-formados em matemática da USP, oferecem boas oportunidades e salários. O perfil multidisciplinar de um bacharel em Matemática Aplicada interessa bancos de investimentos e consultorias”, explica Pais.

Ele informa que o salário inicial de uma analista de risco oscila de R$ 3 mil a R$ 5 mil mensais. “É esperado do egresso, além de conhecimento técnico, capacidade de comunicação, fluência em idiomas, conhecimentos gerais e, sobretudo, capacidade de se adaptar, propor e implementar melhorias”, acrescentou.

Pais finaliza dizendo que, nesse caso, saber matemática por si só não ajuda muito. “É preciso saber interligar conhecimento, ser criativo e audacioso para aplicar as soluções matemáticas nos problemas de outras áreas”.


Confira também a reportagem especial sobre o mercado de trabalho na área de tecnologia da informação (icmc.usp.br/e/9145c) e na área de estatística (icmc.usp.br/e/6a719).


Texto: Denise Casatti - Assessoria de Comunicação ICMC

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